'Transformei desafios em conquistas', diz pecuarista Cláudia Junqueira ao relembrar trajetória pioneira no agro

Pecuarista do interior de São Paulo fala sobre inovação, sustentabilidade e protagonismo feminino

'Transformei desafios em conquistas', diz pecuarista Cláudia Junqueira ao relembrar trajetória pioneira no agro

Pioneira em um setor historicamente masculino, a pecuarista Cláudia Irene Tosta Junqueira, de Ituverava (SP), construiu uma trajetória marcada por coragem, inovação e resultados no agronegócio. Em entrevista ao A Protagonista, ela contou como superou desafios, apostou em tecnologia e sustentabilidade e se tornou referência com a primeira fazenda certificada do estado de São Paulo.

Filha e neta de pecuaristas, Cláudia cresceu entre o gado e as plantações. Mesmo formada em Letras, decidiu escrever sua história na terra. “Desde pequena eu dizia que queria ser fazendeira. Sempre gostei de bicho, de cavalo, de boi. Era uma paixão natural”, relembra.

Logo após o casamento, contrariando amigos que diziam que a vida na fazenda seria “isolada demais”, ela decidiu se mudar para o campo — e nunca mais saiu. “Eu sou comunicativa, festeira, mas encontrei no campo meu verdadeiro prazer. Quando você trabalha com o que ama, não é trabalho, é alegria”, afirma.

Inovação e sustentabilidade: uma visão à frente do tempo

Cláudia sempre acreditou que o sucesso no campo depende de estar aberta à inovação. Foi uma das primeiras produtoras do país a adotar rastreabilidade bovina e a participar de leilões de prenhezes de embriões, quando a técnica ainda era novidade no Brasil.

“Participei do primeiro leilão de prenhezes no país. Ninguém acreditava que uma vaca preta pudesse parir um bezerro branco. Era uma revolução”, recorda, rindo. “Hoje o Brasil é líder mundial em transferência de embriões, e isso mostra a força do produtor que acredita em tecnologia.”

A produtora também acompanhou de perto o avanço da cogeração de energia a partir do bagaço de cana, tecnologia que ajudou a transformar a matriz energética do país. “Na época da seca, quando as hidrelétricas produzem menos, entra a energia gerada pela cana. Isso mostra como o agro é essencial para o Brasil.”

A força da mulher e o papel na sucessão familiar

Com décadas de experiência à frente das propriedades da família, Cláudia é testemunha de como as mulheres vêm conquistando espaço na gestão rural. Segundo ela, a sucessão familiar tem sido um dos principais caminhos para isso.

“Muitas mulheres assumiram os negócios depois de verem problemas em partilhas e heranças. A mulher é detalhista, cuidadosa e humilde para aprender. E quando começa a mostrar resultado, todos passam a respeitar”, afirma.

Para Cláudia, a diferença está no olhar sensível e na gestão próxima das pessoas. “O homem é mais direto, a mulher negocia, conversa, busca um preço melhor. E no dia a dia da fazenda, ela tem empatia. Entrar na casa de um funcionário, ouvir a mulher dele, almoçar com a equipe — isso faz toda a diferença.”

Do conflito à oportunidade: como enfrentou as invasões de terra

Um dos capítulos mais marcantes da trajetória da produtora aconteceu durante as invasões de terras no Pontal do Paranapanema, em São Paulo. À frente de uma fazenda modelo com escola, serraria e laboratório de embriões, Cláudia viu de perto a tensão causada pelos conflitos agrários.

“Foram anos difíceis, mas eu nunca desisti. Eu dizia: ‘Daqui não saio, porque essa fazenda é produtiva e está dentro da lei’. Enfrentei invasões, ameaças e incêndios, mas continuei trabalhando”, relata.

A fazendeira afirma que a situação exigiu não apenas coragem, mas também humanidade. “Mesmo com o conflito, eu ajudava as famílias acampadas. Mandei cobertores, carne, remédios. As crianças não têm culpa. A mulher tem esse olhar humano que muda tudo.”

Em um dos momentos mais tensos, Cláudia decidiu procurar pessoalmente o líder do movimento, José Rainha, para negociar uma trégua. “Fui na casa dele, sem medo. Fizemos um pacto de respeito. Foi um risco, mas trouxe paz para a região e me permitiu continuar produzindo.”

Com o tempo, as terras do Pontal foram regularizadas, valorizadas e pacificadas. “Onde há problema, há oportunidade. Com coragem e fé, consegui transformar aquele momento difícil em crescimento. Hoje, olho para trás e vejo o quanto valeu a pena.”

Exemplo de resiliência e inspiração

Depois de décadas no campo, Cláudia continua à frente dos negócios da família e segue inspirando novas gerações de mulheres rurais. “As mulheres estão mostrando resultado, e é isso que faz a diferença. No agro, ninguém acredita em conversa: o que vale é o resultado.”

Para ela, protagonismo é unir tradição, gestão e paixão. “O agro me ensinou que mesmo nas maiores adversidades é possível rir, seguir e prosperar. Porque quem trabalha com amor nunca desiste.”

Sair da versão mobile